Carregar o telemóvel ou o computador com uma microturbina portátil que gera eletricidade a partir do vento é um dos cenários que a startup portuguesa Windcredible quer fazer acontecer brevemente. Ter turbinas em telhados nas cidades também. O design é diferente, as peças são fabricadas em Portugal e o espaço no mercado é enorme, como contaram ao Dinheiro Vivo o CEO Filipe Fernandes e o diretor de tecnologia Nelson Batista.
“Nós estamos com um design inovador, de eixo vertical”, explicou Filipe Fernandes. “A principal diferença para a concorrência é ser silencioso enquanto produz. É também bastante eficiente para o tipo de design de que estamos a falar”, descreveu, explicando que a turbina produz pouca vibração e é mais segura para a fauna envolvente. “Temos aqui características muito interessantes para conseguirmos instalar este equipamento em meios urbanos”, salientou.
A tecnologia transforma a energia cinética em energia elétrica para ser aproveitada onde está a ser produzida e funciona em qualquer lugar, desde que exista vento. “O nosso foco é o meio urbano, mas temos interesse em clientes noutras zonas, como zonas industriais, zonas próximas da costa, um bocadinho mais dispersas.”
A Windcredible desenvolveu três modelos de dimensões e aplicações diferentes, com protótipos que já estão a ser testados. O design foi concebido por Nelson Batista há 14 anos mas a empresa só foi criada em 2022 e começou oficialmente a atividade no início de 2024, tendo recebido um investimento inicial de 300 mil euros e passado pelo programa de aceleração Vodafone Boost Lab.
Segundo Batista, a turbina mais pequena é para consumos ligeiros, como o carregamento de portáteis, telemóveis ou power banks. A turbina de tamanho médio pode servir as necessidades de uma família: a estimativa é que permita produzir anualmente 20% a 50% do consumo de uma família de quatro em Lisboa. E a grande é para aplicações industriais.
O foco atual está na turbina média, que pode ser instalada no telhado se este conseguir suportar a base ou em torre, por exemplo no jardim ao lado da casa. Num edifício com vários apartamentos, será partilhada pelo condomínio.
Este é o modelo que conquistou os primeiros seis clientes para a Windcredible – Nestlé, Porto de Lisboa, Galp, EDP, Prio e Allprocare, com as instalações em curso nos próximos meses. As pás são fabricadas em Vila Franca de Xira e os componentes metálicos no Porto. Os componentes elétricos, como o gerador e o controlador, são importados de fora da Europa porque a Windcredible ainda não conseguiu um fornecedor europeu ou nacional. Motivo: este tipo de equipamentos quase foi descontinuado ao longo dos últimos dez a quinze anos.
“Houve uma grande aposta no solar e praticamente todas as empresas a operar no mercado focaram-se no fotovoltaico”, explicou Filipe Fernandes. “Temos agora o trabalho adicional de trazer esta tecnologia para os dias de hoje”.
O responsável disse que os projetos eólicos, ao contrário dos solares, mantiveram-se centralizados e com turbinas cada vez maiores. “Não houve este passo atrás de testar e desenvolver a uma escala pequena mas que faça sentido”, frisou.
O modelo de negócio que a Windcredible pretende seguir é desenvolver a tecnologia, vender o produto e estabelecer parcerias para a distribuição e instalação, aproveitando os canais que já estão estabelecidos para o solar.
“São os próprios instaladores e distribuidores que vêm falar connosco porque os seus clientes pedem turbinas”, revelou. “Vamos aproveitar aquilo que já está estabelecido, produzir aquilo que realmente faz falta e ninguém está a fazer e ganhar volume e escala, que é a nossa principal dificuldade”, afirmou. “E apoiarmo-nos na infraestrutura que já está montada para o solar e para as baterias.”
O processo de certificação deverá estar concluído em meados do próximo ano, com uma ronda de 50 projetos piloto em andamento. “A nível de interesse e procura deste tipo de soluções, temos sentido muito esta atração”, disse o CEO. “O desafio está do nosso lado, conseguirmos produzir e entregar a tempo. A nível de necessidade acho que nunca houve tanta.”
Isso tornou-se mais visível após a invasão da Ucrânia pela Rússia, em 2022, que desestabilizou os mercados energéticos na Europa. “A guerra na Ucrânia fez repensar muito as estratégias de cada país no que diz respeito à soberania energética, a capacidade de autossustentação”, indicou o executivo. “Houve um caminho, aumentou-se a capacidade instalada desde então e vai continuar a aumentar o número e o volume de instalações.”
A Windcredible olha para a sua oferta como complementar à energia fotovoltaica, onde está a grande concentração de investimentos. O problema do solar, disse Fernandes, é que apesar de ser economicamente viável também tem limitações. Por exemplo, não produz durante a noite e reduz a capacidade de produção durante o inverno.
“Nós estamos a abordar o mercado numa ótica de complementaridade e sinergia com o que já existe”, salientou. “Em Portugal, podemos perfeitamente ter 70% da capacidade de produção solar e os remanescentes serem eólicos.”
O objetivo é chegar a um sistema equilibrado com estas duas fontes de energias renováveis e desenvolver a capacidade de armazenamento. “Desta forma, conseguimos mitigar as lacunas de cada uma das tecnologias.”
O terceiro modelo previsto pela Windcredible, que ainda está em desenvolvimento, é um design maior para aplicações mais intensas de energia, como indústrias e parques eólicos, onde há uma necessidade maior do que os dois equipamentos mais pequenos.
Ana Rita Guerra