A tecnologia é uma ferramenta agnóstica e nós decidimos o que fazer com ela: esse é o ponto de partida para o futurista e especialista ambiental Ed Gillespie, que esta semana estará no Porto para falar na 6ª edição da Vodafone Business Conference, dedicada ao tema Sustainable Technology.
“A tecnologia sustentável tem de ser útil para nós, no momento e nos espaço em que nos encontramos”, disse em entrevista ao Dinheiro Vivo. “Dadas as múltiplas crises que termos a juntar-se à nossa frente, tem de ser eficaz a ajudar-nos a navegar os desafios futuros.”
Na sua apresentação, Ed Gillespie pretende ser “muito desafiador” e levar a audiência a questionar uma série de pressuposições.
“Quero desafiar a presunção de que toda a tecnologia é boa, toda a tecnologia tornas as coisas melhores e que a tecnologia nos leva numa só direção”, afirmou. “Quero desafiar em particular a dinâmica em torno dos dados, que é suposto tornarem-nos mais inteligentes. Estamos a recolher e agregar quantidades insanas de dados sem fazer nada com eles. E isso tem enormes custos energéticos.”
Uma das questões com que as empresas lidam neste momento é a voracidade energética da Inteligência Artificial, que está a exigir a construção de mais e maiores centros de dados em todo o mundo.
“Quero desafiar a ideia de que a IA nos está a ajudar neste momento, porque as emissões de carbono da Google subiram 48% nos últimos cinco anos, as das Microsoft subiram 29% desde 2020 e isso está sobretudo relacionado com a IA”, salientou Ed Gillespie.
Mas o autor não quer fazer esmorecer o entusiasmo em torno destas inovações, antes alertar para a forma como são utilizadas. “Penso que estas tecnologias podem ser brilhantes, mas não estamos a usá-las corretamente.”
Os centros de dados precisam de muita energia e água para arrefecimento, referiu o especialista. Todavia, o problema é que “não acedemos a 90% dos dados que armazenamos três meses depois do armazenamento.” Ou seja, os dados ficam parados e há necessidade de os limpar para tornar os sistemas mais eficientes. “Da mesma forma que o planeta está cheio de plástico, o planeta está agora cheio de dados inúteis, por isso temos que proceder a uma limpeza”, frisou.
Ed Gillespie referiu que a IA desviou os objetivos de descarbonização das grandes tecnológicas e considerou que há agora um dilema moral perante a sociedade. “Não é simples. A tecnologia não é boa ou má, mas também não é neutra. Por isso, temos de tomar decisões muito conscientes sobre o que implementamos, como implementamos e onde implementamos, sob pena de aumentarmos o problema.”
Um dos maiores desafios é como aplicar inovações em modelos antigos. “A forma como a tecnologia tende a ser implementada é em cima do modelo de negócio existente”, referiu Ed Gillespie. “E se automatizarmos um processo ineficiente, automatizamos a ineficiência.” Isso reflete-se, por exemplo, no facto de o próprio ChatGPT acusar problemas e “alucinar”, inventando respostas ou demonstrando preconceitos terríveis.
Gillespie trabalha de perto com líderes e CEO e revelou que muitos reconhecem o problema e a realidade, mas simplesmente não sabem o que fazer a seguir.
Ainda assim, há bons exemplos de empresas que conseguiram transformar positivamente o seu modelo de negócio. Uma delas é a Danish Oil and Natural Gas, que operava num dos sectores críticos da energia: passou de combustíveis fósseis a quase 100% de energia renovável. Demorou cerca de 12 anos a fazer a transição. “Exemplos como este mostram que, com a ambição e a aspiração certas, podemos fazê-lo comercialmente. Mas requer um grande compromisso.”
O autor acredita que o momento é de fazer as coisas em grande e agora, porque andamos há muitos anos a falar do mesmo. Na Semana do Clima em Nova Iorque, toda a gente dizia que está na altura. “Mas está na altura há 25 anos”, exclamou Gillespie. “E continuamos a dizer que está na altura”, continuou. “Podemos fazer algo agora, e fazê-o diferente?”
Essa é uma das questões que serão debatidas amanhã, na Vodafone Business Conference que decorre no Porto. As inscrições são gratuitas e o evento será transmitido em direto.
Ana Rita Guerra