A próxima geração tem o poder de desencadear novos modelos de negócio pelas suas características técnicas, mas será em conjunção com outras tecnologias que dará gás a uma revolução nas empresas. Esta foi uma das ideias que o responsável de marketing da Ericsson para Portugal e Espanha, Jaime Trapero, explicou à margem da Vodafone Business Conference, onde o 5G foi o tema central.
O especialista centrou-se na forma como será necessário repensar os modelos de negócio de modo a capitalizar nas vantagens da nova geração móvel. Portugal poderá beneficiar em áreas específicas, como turismo, manufatura e agricultura, em conjunção com outros avanços na inteligência artificial e Internet das Coisas. No entanto, implementar a tecnologia não será suficiente. A criação de um ecossistema que envolva empresas, startups, academia e até governo será essencial para retirar da próxima geração o potencial de aumento de receitas e de produtividade que se projeta para a próxima década.
Na conferência, que decorreu na Fundação Champalimaud, Trapero partilhou os resultados de um estudo da Ericsson e Arthur D. Little que preveem um potencial de geração de 3,6 mil milhões de euros para Portugal até 2030, com o advento da nova tecnologia. O responsável apresentou ainda alguns cenários futuros para o país, onde se espera que o 5G chegue depois do verão.
Qual é a coisa mais importante que a audiência leva da conferência sobre 5G?
Creio que a ideia fundamental é que a tecnologia está aqui, está disponível agora mesmo, temos essa possibilidade, e o interessante é contrastar e ver os possíveis modelos de negócio ao redor do 5G. A ideia do negócio potenciado pelo 5G que apresentámos, que notámos na apresentação de hoje, creio que é fundamental. Agora vemos esses atributos que a tecnologia 5G pode dar às empresas para conseguir esse potencial de negócio. É importante trabalhar não só a parte tecnológica mas também a parte do negócio, mais marketeira também nesse lado.
Falou na sua apresentação de ir pela autoestrada e ter realidade aumentada no pára-brisas. Para quando podemos esperar isso e como o 5G irá influenciar esse cenário?
O 5G, como muitas tecnologias como a Inteligência Artificial, etc., o 5G vai ser um facilitador. Do ponto de vista de melhorar a conectividade, da latência, largura de banda, vai proporcionar uma experiência de condução muito melhor. Não obstante, não é a única tecnologia nesse sentido. E falávamos dessa viagem virtual até ao Porto em 2028 precisamente com a ideia de virtualizar as possíveis infra-estruturas viárias. Imagina que a um dado momento podemos tirar todos os sinais de trânsito e seja através de um pára-brisas de realidade aumentada onde podemos receber todos esses tipos de informação. Não apenas relacionado com sinais de trânsito mas qualquer tipo de incidente ou acidente que ocorra mais à frente e que de alguma maneira redimensione a velocidade a que devemos seguir no carro. E à parte, bom, há uma quantidade de casos de uso ou de informação que podemos ir vendo na rota, desde pontos de interesse, restaurantes, estradas, todo o tipo de informação que possamos sobrepor nesse pára-brisas de realidade aumentada.
Quais são os sectores em que a Ericsson antecipa mais casos de uso em Portugal?
As indústrias, nesse sentido, creio que obedecem muito à realidade de cada país. Falámos da parte de manufatura, indústria 4.0, creio que é uma das áreas mais interessantes, vimos também no potencial de negócio. Vimos também a parte de saúde, sobretudo com a explosão destes dispositivos wearables, que dão informação, monitorização, etc. Também vimos a parte automóvel, mas a parte de energia e utilities também é bastante interessante. Não há que se restringir.
Creio que é preciso adaptar estes grandes números que demos à realidade de cada um dos países e ver um pouco o mix produtivo que tem cada país. Desde logo se falamos de Portugal, e extrapolo um pouco a referência do caso de Espanha, somos referência, ambos os países, em turismo. Portanto o lógico é que comecemos a pensar em possíveis casos de utilização relacionados com os nossos pontos fortes, realidade e turismo imersivo, etc.
Que trabalho específico estão a fazer com a Vodafone em Portugal?
Trabalhamos com a Vodafone há bastante tempo, nas áreas referenciadas fomos o parceiro de referência, desde a parte de “holoporte” em Paredes de Coura, toda a parte de roaming que tivemos entre Tui e Valença do Minho. É uma relação muito duradoura.
Como se comparam os mercados de Espanha e Portugal neste momento?
A diferença fundamental é que o lançamento ocorreu num sítio antes do outro, mas toda a tecnologia, como falava Mischa Dohler da democratização, hoje não há barreiras entre países para esta tecnologia. O que estamos a fazer é adquirir mais experiência com estes casos de uso que antes foram testes. Estamos a testar as potencialidades do 5G futuro, que serão realidade quando pudermos lançá-lo.
Em termos de recetividade, as empresas estão no mesmo ponto quanto aos projetos que querem fazer?
No geral, quanto ao estado da digitalização nas empresas e das indústrias, partimos de uma realidade que hoje em dia não tem fronteiras. A situação é muito parecida, todos estão de acordo que a digitalização vai ser chave para os negócios. Quanto aos sectores que estão mais ou menos avançados, creio que isso obedece mais à casuística de cada empresa, de cada país em concreto.
Considera que muitas destas empresas terão de passar por essa transformação digital antes de abraçarem o 5G?
É um todo. O 5G vai facilitar algumas das receitas, mas não será o responsável por tudo. Falamos de 39% desse potencial global do mundo ICT, isto acompanhado antes de uma transformação digital. E cada um dos sectores tem as suas especificidades. Falámos da agricultura, por exemplo, desde logo as oportunidades vêm não só por causa das receitas mas também pela parte das eficiências. Em todo o processo de digitalização começamos sempre com uma otimização, no momento de reduzir os custos. Depois dessa digitalização e otimização vamos aumentando as possibilidades de novas mudanças no processo, que o que fazem é dar a possibilidade de ganhar mais receitas.
Qual a importância de debater o 5G neste momento, antes da chegada?
Parece-me importante em Portugal e em todos os países. Isto não se trata de uma história solitária em que uma empresa chega e faz tudo. Trata-se de criar um ecossistema em que, como falámos antes, sem nenhum tipo de obstáculos, esquecendo-nos dessas barreiras, podemos pôr em cima da mesa qualquer ideia, louca que seja, e vemos como podemos filtrar ou não quais serão modelos de negócio viáveis. Mas de um ponto de vista de construir um ecossistema, com startups, de criatividade, que é essencial para inovar numa tecnologia como o 5G.
A Ericsson trabalha com o King’s College, o que destacaria dos exemplos que Mischa Dohler levou à conferência?
Mischa tem o potencial de cativar, no sentido em que nos dá uma visão muito visionária, passo a redundância, mas que é muito real. Isto do ponto de vista que une o melhor dos dois mundos. O mundo da empresa e o mundo da universidade, coisa que considero muito interessante. Quando falamos de ecossistema, não falamos apenas do mundo da empresa ou dos governos, falamos também da parte académica. Essa parte de inovação, de startups, de escolas de negócio, não apenas a tecnologia mas os modelos de negócio subjacentes, que vão propiciar estes casos de uso.
Que mensagem deixaria aos interessados no potencial do 5G?
A mensagem é que a tecnologia está aqui, como foi comentado por alguns membros da audiência. Trabalhemos sobretudo na parte dos modelos de negócio e vejamos como podemos fazê-los andar. Não estamos a falar simplesmente de surfar uma nova onda tecnológica pela tecnologia per se, mas das possibilidades de negócio.
Ana Rita Guerra