Quando um vídeo publicado nas redes sociais tem legendas em múltiplas línguas, a audiência que o vê e partilha aumenta exponencialmente. Esta é uma das áreas em que a empresa portuguesa Unbabel, que usa inteligência artificial e editores humanos para fazer traduções, está a apostar. Com o produto de vídeo da Unbabel, é possível ter legendas em 28 línguas diferentes por “uma fração” do que custaria contratar tradutores nativos para cada uma. “Há um consumo gigantesco de vídeo sem som nas redes sociais, se não tiverem legendas a coisa não funciona”, explica ao Dinheiro Vivo Vasco Pedro, cofundador e CEO da empresa.
O responsável vai passar o próximo mês em São Francisco, onde se localiza o escritório norte-americano da Unbabel, num processo de negociação para a próxima ronda de financiamento. “Não precisamos de dinheiro, mas há uma boa oportunidade”, esclarece. “Como temos tido muito interesse do mercado, a melhor altura para levantar dinheiro é quando as pessoas querem dá-lo”, acrescenta, referindo que o destino da nova ronda será a aceleração do crescimento da Unbabel.
Agora com mais de 200 empregados e uma comunidade mundial de 150 mil tradutores freelancers, a empresa desenhou um plano de expansão ambicioso. Por um lado, vai intensificar os seus esforços nos Estados Unidos, onde o escritório de 15 pessoas deverá crescer.
Por outro lado, pretende abrir novos escritórios na Europa e tem como objetivo Alemanha (Munique ou Berlim) e França (Paris). “Queremos continuar a crescer a equipa de inteligência artificial, produto, engenharia, ainda há muita coisa para construir”, estabelece Vasco Pedro. “E para o ano queremos entrar na Ásia.” O CEO nota que o par de línguas inglês-japonês é um dos que está a crescer de forma significativa na plataforma, o que naturalmente coloca o Japão como mercado-alvo nesta região. Além disso, o interesse será também dirigido ao sudeste asiático e potencialmente China.
O que a Unbabel faz desde 2013, ano em que foi fundada, ainda não tem concorrência direta, garante o executivo português. “O que nós resolvemos é a capacidade de escalar o serviço de apoio ao cliente, é o nosso core neste momento.” Por exemplo, uma equipa de alemães que serve o mercado alemão pode passar a estar em qualquer parte do mundo. “Qualquer desses agentes passa a poder fazer suporte em 28 línguas”, diz Vasco Pedro, desde que o suporte seja em texto (email e chat).
Os custos são 40% a 50% mais baixos, mas há também uma componente de satisfação que entra na equação. Os clientes da Unbabel são tipicamente empresas B2C (business-to-consumer) e a subscrição de “tradução como serviço” faz com que deixem de estar restringidos pelo número de pessoas que falam uma certa língua. “À medida que há email e chat a vir nessa língua, pode-se usar qualquer um dos agentes para responder e isso faz com que o tempo de primeira resposta seja mais rápido do que costumava ser”, exemplifica Vasco Pedro. “Esse tipo de métricas influencia muito a satisfação dos clientes [finais].”
Entre os 150 clientes que subscrevem os serviços da Unbabel estão nomes como Microsoft, Facebook, Booking, KLM, Rakuten e Easyjet.
Toda a engenharia da plataforma da Unbabel é desenvolvida em Portugal, onde a empresa tem 185 pessoas. O processo é duplamente complexo: parte da ideia de usar inteligência artificial para traduzir, mas inclui outros componentes. Um é reutilizar os dados produzidos pelos humanos para melhorar continuamente o sistema artificial, através de um feedback loop positivo em que tudo o que é traduzido pelos humanos é reaproveitado pela IA.
A outra componente é a utilização de IA para tornar os humanos mais eficientes. Vasco Pedro explica que as próprias ferramentas que os tradutores humanos estão a usar têm tecnologia de inteligência artificial embebida, que os ajuda a ser mais eficientes e isso reflete-se na produtividade. Enquanto um tradutor fora da Unbabel consegue traduzir cerca de 400 palavras por hora, na plataforma portuguesa traduz 2400, estima o responsável.
A empresa usa uma redes neurais e deep learning com a particularidade de serem adaptadas aos clientes. “Começamos com modelos gerais e neste momento já temos uma série de modelos diferentes dependendo do vertical, do tipo de cliente, tom formal”, adianta o CEO. “Em cima disso usamos os dados do cliente para continuar a melhorar o modelo de inteligência artificial.” Ou seja, o sistema adapta-se cada vez mais ao tom do cliente e à sua maneira de escrever, o que depois facilita o trabalho dos seres humanos e aumenta a qualidade do produto final. “Esta simbiose entre o ser humano e a IA”, considera Vasco Pedro, “é particularmente interessante.”
No início do ano passado, a empresa levantou 23 milhões de dólares numa Série B em que participaram a Microsoft Ventures, Salesforce Ventures e Caixa Capital, entre outras. Agora, não há um objetivo fixado: aquilo que a empresa portuguesa quer é acelerar o ritmo de um crescimento que continua a desbravar caminho no mercado.
Ana Rita Guerra, Los Angeles