Uma das maiores fabricantes norte-americanas de carpetes, Interface, passou a última década a recolher velhas redes de pesca e fios de nylon, que estavam a destruir recifes de corais e florestas de mangais, e a reintroduzi-los no seu processo produtivo. A empresa encontrou mesmo uma nova fonte de receitas ao vender esses materiais a outras fabricantes que usam nylon. É um exemplo de economia circular que Jessica Groopman, fundadora do Regenerative Technology Project, destaca como sendo um dos melhores na indústria têxtil.
“Há muitas empresas que estão a conduzir transformações sistémicas”, disse ao Dinheiro Vivo a especialista em inovação, que será uma das oradoras da Vodafone Business Conference a decorrer na próxima semana, no Porto. Encontram-se exemplos na moda, na agricultura, na ‘big tech’, na alimentação e outros sectores. Em comum está a consciencialização de que os seus modelos de negócio não sobreviverão no longo prazo se continuarem a atuar como até agora.
“É verdade que as empresas precisam de ter lucros e ser viáveis financeiramente”, pontuou. “Mas em muitos casos, se continuarem a fazer o que estão a fazer isso também não vai resultar”, avisou. “Não é financeiramente viável no longo prazo ser altamente extrativo, destruir os recursos naturais de que o negócio depende ou de que os parceiros dependem.”
Groopman, que trabalha como conselheira de inovação na Intentional Futures, diz que os líderes empresariais estão recetivos à mudança, apesar das tensões que surgem com os conselhos de administração, mercados financeiros e resultados trimestrais. Um dos motivos é o surgimento de indicadores que mostram que ser sustentável tem maiores benefícios económicos que ignorar o problema.
“Podemos gerar mais receitas no longo prazo se melhorarmos os ecossistemas de que dependemos, se apoiarmos as comunidades e parcerias”, salientou. “Os incentivos de longo prazo requerem uma mudança das práticas e talvez do modelo de negócio, iniciativas e investimentos, mas há retornos financeiros também nesse caso.”
A mudança de estratégia assenta numa forma diferente de olhar para a sustentabilidade. Jessica Groopman defende que não só podemos como devemos ir além da tecnologia sustentável, que é o tema da 6ª edição da Vodafone Business Conference, e pensar como chegar à tecnologia regenerativa.
“É olhar para a tecnologia como uma ferramenta de criação de condições para fazer bem à sociedade, economia e ambiente”, sintetizou. A especialista frisou que tal não está limitado a qualquer tipo de tecnologias em particular: desde a Inteligência Artificial ao blockchain, Internet das Coisas, 5G, wearables e impressão 3D. Mais: argumenta que não devemos limitar-nos ao digital, mas olhar também para soluções “low tech” que não necessitam de implementação digital.
Trata-se de uma forma nova de pensar negócios e inovações, partindo de uma pergunta desconfortável – o que é que estamos exatamente a tentar sustentar? “Se os nossos modelos atuais são o que são, isso não é de todo sustentável”, salientou. “A forma como a ecologia e o mundo natural funcionam é pela cura, restauração, regeneração de sistema vivos”, frisou. “Esse é o modelo sustentável.”
A edição 2024 da Vodafone Business Conference, dedicada ao tema “Sustainable Technology”, decorre no Mosteiro de São Bento da Vitória, no Porto, a 11 de outubro. Além de Jessica Groopman, terá como oradores a diretora de inovação da Galp, Ana Casaca, e o empreendedor ambiental Ed Gillespie.
Ana Rita Guerra