Será difícil superar o problema da sustentabilidade sem tecnologia e inovação, mas os avanços têm de ser aplicados de forma eficiente para não aumentarem o desafio. Esta é uma das principais conclusões da 6ª edição da Vodafone Business Conference, que decorreu no Mosteiro de São Bento da Vitória, no Porto, com a intervenção de oradores nacionais e internacionais.
“A sustentabilidade é o desafio que temos pela frente, o desafio que não podemos falhar”, afirmou o CEO da Vodafone, Luís Lopes, na abertura da conferência dedicada ao tema Tecnologia Sustentável. “Continuamos a acreditar que através da inovação, de sermos capazes de alterar a maneira como operamos e como fazemos negócio, é a resposta para resolvermos o problema da sustentabilidade”, considerou.
O executivo destacou a importância da conectividade e digitalização para endereçar o problema, que é primariamente ambiental mas também toca na sustentabilidade das economias e da sociedade. “A tecnologia vai ser um aspeto incontornável para essas alterações, para os desafios que temos”, frisou.
O futurista e autor Ed Gillespie alertou, no entanto, que um dos princípios da tecnologia é que pode ter consequências não intencionais. “A marcha do progresso não é sempre linear”, afirmou. “Às vezes tiramos os olhos do alvo e acabamos por retroceder e criar condições que dificultam o progresso no futuro.”
Gillespie chamava a atenção para o facto de o investimento em Inteligência Artificial ter levado a um aumento considerável das necessidades energéticas e emissões de carbono de gigantes como a Google e a Microsoft nos últimos anos. “Um dia pode ser benéfica, mas neste momento a IA está a conduzir-nos rapidamente na direção errada”, afirmou.
Ao mesmo tempo, a produção e armazenamento de quantidades maciças de dados não está a ser eficiente nem a ser devidamente aproveitada pela maioria das empresas. “Toleramos uma enorme quantidade de desperdício”, apontou o especialista britânico. “90% dos dados nunca mais são consultados três meses depois do seu armazenamento.”
Mas Gillespie também deu bons exemplos de como tecnologias IA estão a tornar sistemas mais eficientes, tal como a aplicação de aprendizagem automática para prever a produção energética de turbinas eólicas e melhorar a gestão das redes elétricas.
Maior eficiência energética é precisamente um dos objetivos do projeto Caxias Living Lab, que a head of innovation da Galp Ana Casaca apresentou durante a sua intervenção. Trata-se de uma “comunidade energética” em fase piloto que foi montada ao longo de 15 meses para testar soluções. “Estamos a tentar perceber que tipos de modelo de negócio podemos ter aqui”, explicou Ana Casaca, referindo que o objetivo é que o consumidor final possa poupar nos custos da energia e beneficiar de uma bateria comunitária, capaz de armazenar a produção de várias casas e ser utilizada por todos.
A responsável explicou como a Galp está a abordar a inovação no sector da energia, onde o foco comum é a descarbonização gradual, mas deu pistas que podem ser usadas por todo o tipo de indústrias. “A inovação não é uma área, não é um departamento”, frisou, explicando que é preciso haver uma política de inovação aberta e em colaboração permanente. “A inovação tem que acontecer em todo o lado na empresa.”
Foi uma abordagem pragmática para uma questão com que as organizações se deparam um pouco por todo o lado. Jessica Groopman, fundadora do Regenerative Technology Project e conselheira de inovação sénior da Intentional Futures, disse que a inovação nos próximos 200 anos estará centrada na reconexão com os sistemas que nos suportam.
O argumento da especialista norte-americana, que trabalha em Silicon Valley, é que teremos de ir além dos objetivos de sustentabilidade e trabalhar para regenerar o ambiente e tornar a sociedade e as empresas mais saudáveis. Groopman salientou que é precisa uma “mudança regenerativa” que resolva as deficiências do modelo atual, em que há um investimento insuficiente em capital social e natural.
“O que é que procuramos sustentar?”, questionou a especialista, uma das coautoras do novo livro “The Fast Future Blur.” “Vivemos em desigualdade maciça”, afirmou, apontando para os problemas da economia linear, desde enormes quantidades de lixo a crises de saúde mental.
“O que eu proponho é que estamos num ponto crítico para a transformação de negócios para lá do digital e da sustentabilidade”, afirmou. “A regeneração é o processo da vida, é como a vida se sustenta”, sublinhou. “A sustentabilidade é o resultado do processo de regeneração.”
Em termos práticos, isto traduz-se na alteração dos modelos de negócio para imitar os padrões universais dos sistemas vivos. Ou seja, adotar uma abordagem sistémica que permita endereçar múltiplos sistemas com o mesmo design.
Em vez de tentarem ser neutros ao nível de pegada ambiental, Jessica Groopman defende que os negócios devem tentar ser regenerativos, alcançando um saldo positivo. Por exemplo, investindo na circularidade de materiais e produtos, algo em que empresas como a Walmart e PepsiCola estão a apostar.
A especialista disse que há agora maiores incentivos económicos para alterar os modelos de negócio. Não só as alterações climáticas são dispendiosas – calcula-se um custo de 2,4 biliões de dólares por ano em 2050 – como ter empresas altamente exploradoras e extrativas ameaça o negócio no longo prazo.
“Transitar para uma economia de baixo carbono é bom para o PIB”, salientou. “Precisamos de tentar ir mais rapidamente e mais além de apenas carbono zero.”
Ana Rita Guerra