Henrique Fonseca, administrador da Vodafone Portugal com o pelouro da Unidade de Negócios Empresarial, acredita que este é o momento certo para falar dos benefícios da realidade aumentada e virtual aplicada às empresas. Dentro de três anos, acredita, a realidade estendida fará parte do dia-a-dia.
Henrique Fonseca, administrador da Vodafone Portugal com o pelouro da Unidade de Negócios Empresarial, acredita que este é o momento certo para falar dos benefícios da realidade aumentada e virtual aplicada às empresas. Dentro de três anos, acredita, a realidade estendida fará parte do dia a dia.
Porquê uma Vodafone Business Conference sobre Extended Reality nesta altura?
Nós gostamos de falar sobre temas que esperemos que possam vir a ter impacto e contribuir para ajudar a evoluir as nossas empresas. A realidade estendida, por ser um conceito que inclui várias tecnologias imersivas como a realidade aumentada e virtual, é algo que agora que já temos 5G em Portugal vemos que pode ser potenciado.
Como é que a Vodafone se posiciona nesta área para lá do fornecimento de serviço? Pretende ser co-criadora de soluções XR?
É aí que vemos que podemos criar mais valor. Obviamente que, para que a realidade aumentada e virtual possam contribuir para as empresas, o 5G tem um papel muito importante, na medida em que o processamento de informação deixa de ser feito nos óculos e pode passar a ser feito na nuvem. Há um papel de ‘enabler’, permitir que esta tecnologia possa ser útil.
Mas nós queremos fazer mais do que isso. Com a experiência que temos, decorrente de estarmos num grupo internacional que já explora redes 5G há mais de três anos e está presente em mais de vinte países, temos acesso a um capital de experiência que queremos disponibilizar aos empresários portugueses.
Queremos ser um co-criador de soluções porque temos conhecimento acumulado e acesso a uma rede de parceiros que nos ajuda, indústria a indústria e em co-criação com os nossos clientes, a encontrar as melhores soluções.
Quais são alguns desses parceiros com que a Vodafone a trabalhar em XR?
Estamos a trabalhar com vários tipos de empresas. A Cap Gemini Engineering é um bom exemplo. É um parceiro com quem nós em Portugal já fizemos entre 15 a 20 soluções.
No centro de demonstrações, quando convidamos uma empresa para vir ver os produtos e serviços que disponibilizamos, temos soluções que desenvolvemos com a Cap Gemini Engineering para poder ilustrar esse casos de utilização. Vários casos em ‘smart cities’, desde como as rotas do lixo podem ser automatizadas e otimizadas a como é que a realidade aumentada numa fábrica pode ajudar a fazer a manutenção.
Temos outra empresa, um ótimo exemplo de PME, com quem desenvolvemos a transformação digital do Museu da Lourinhã, que inaugurámos em plena pandemia. É uma empresa chamada Cycloid, 100% portuguesa, que está focada no desenvolvimento deste tipo de soluções.
Nós próprios temos serviços ao cliente final em que também utilizamos realidade aumentada. O cliente usa a câmara do telemóvel e quem está do lado do call center está a ver a mesma coisas.
Quantas pessoas estão dedicadas à XR na Vodafone Portugal?
Temo-nos preocupado em ter competências dentro de casa e uma rede de parceiros com essas competências. Trabalhamos muito no desenvolvimento deste tipo de soluções e vamos alocando recursos humanos da área técnica, de pré-venda, comercial e marketing para trabalhar em projetos à medida que são necessários.
Recentemente vi um estudo que dizia que este é um segmento que está a acelerar tanto com o 5G que se estimava que, no mundo inteiro e até 2025, ia haver mais de um 1,2 milhões de pessoas a trabalhar nesta área.
Há um orçamento específico dedicado à criação de competências e soluções XR?
Temos um investimento específico para assegurar a criação deste tipo de competências, frameworks e modelos que permitam depois ser adaptados à real necessidade do cliente. Não temos aqui uma solução que serve para todas as empresas. Temos competências que fomos ganhando internamente e também vamos beneficiando da experiência do grupo Vodafone ao longo dos últimos três anos. À medida que vamos tendo clientes a desenvolver este tipo de projetos, vamos buscando estas competências internas, quer sejam locais quer sejam no grupo, e vemos quem é que são os parceiros locais ou internacionais que estão melhor posicionados para nos ajudar consoante o desafio que o cliente tem.
Estas soluções requerem investimentos à cabeça, em especial no caso dos óculos. Como se pode calcular o retorno do investimento em soluções imersivas?
Quando estamos a discutir com uma empresa ou autarquia as vantagens que a realidade aumentada ou virtual têm – concretamente virtual, porque precisa sempre dos óculos – fazemos uma análise de custo-benefício. Quais são as vantagens que vão tirar daqui? Pode ser os alunos aprenderem mais depressa e reterem mais informação, pode ser os visitantes gostarem mais da experiência e isso atrair mais visitantes, pode ser a diminuição dos custos com técnicos que já não têm que ir à fábrica ver a manutenção da máquina, porque podem fazer isso à distância.
Um dos casos de utilização no Reino Unido, numa universidade que treina pessoal médico, concluiu que quando dava as aulas com acesso a óculos de realidade virtual, à saída os alunos retinham até 80% daquilo que tinha aprendido. Quando faziam a mesma aula sem os óculos, a percentagem era de 20%.
Em Portugal, que áreas estão mais abertas a tecnologias XR? São procurados por algum tipo de organizações?
Infelizmente ainda somos muito pouco procurados e temos de ser próativos. Essa também é uma razão para fazermos esta conferência. Queremos mostrar que a tecnologia já existe e o enabler para essa tecnologia é o 5G. Estão reunidas as condições para se poder utilizar esta tecnologia e dar uma experiência mais imersiva num momento cultural num museu, ou para fazer evoluir a manutenção numa fábrica, ou para mudar a forma como se ensina os estudantes.
Ainda somos pouco procurados mas não é uma coisa específica nossa, é do sector. Não há uma procura generalizada no sector. Nós, tal como as restantes empresas que produzem este tipo de tecnologia, temos um papel a fazer de forma a demonstrar às empresas e instituições que já estão reunidas as condições de tecnologia, software, até de disponibilidade dos utilizadores finais para ter acesso.
No princípio, havia quem enjoasse com os óculos de realidade virtual. Isto já evoluiu muito.
Há algum exemplo que se deva destacar pela abrangência ou resultados?
Tudo o que tem a ver com saúde é algo que nos faz querer acelerar isto, porque podemos estar a falar de salvar vidas humanas. Há dois anos fizemos um teste com a Cruz Vermelha em que demostrámos que, se um enfermeiro que vai numa ambulância tiver uns óculos com realidade aumentada, consegue ir passando informação em tempo real e mostrar ao médico que está no hospital à espera do paciente o que se está a passar. O médico pode preparar-se para aquilo que tem de fazer e pode ir dando instruções ao enfermeiro.
Isso poderá ser particularmente interessante em áreas rurais, onde há escassez de médicos?
Sim. Com o impacto que a pandemia teve no aumento da digitalização esse é um ótimo exemplo. Recordo-me de vários locais que não tinham acesso ao hospital em que as pessoas iam à Junta de Freguesia para poderem ter teleconsultas. A Vodafone ajudou muitas Juntas a terem condições para fazerem consultas à distância. O próximo passo vai ser equipar estas entidades com dispositivos de forma a que as pessoas que vão lá possam ser acompanhadas ainda mais de perto com este tipo de tecnologias.
Qual o horizonte temporal em que poderemos ver uma utilização massificada destas soluções?
Realisticamente, há ainda aqui um caminho a percorrer. Temos visto uma série de projeções sobre o desenvolvimento destas tecnologias a massificarem-se à volta de 2025, mais ou menos a três anos de distância.
Pela parte que nos toca, vamos tentar acelerar isso o mais possível. Esta conferência é já um desses passos.
Portugal pode estar na linha da frente, ou o atraso do 5G acabou por atrasar também isto?
Há um atraso na medida em que em maio de 2022 ainda há muito poucas soluções a serem utilizadas. No entanto, à medida em que vamos implementando essas soluções, vamos conseguir andar mais depressa do que outros países estavam a andar há dois anos. A nossa taxa de crescimento vai ser mais rápida que a dos outros países, apesar de partimos atrasados, mas nada que não consigamos recuperar.
Na Vodafone vamos capitalizar nas experiências que os nossos colegas dos outros países têm vindo a implementar para tentar acelerarmos isto junto dos nossos clientes.
E haverá possibilidade de Portugal exportar know-how e soluções em XR?
Não tenho qualquer dúvida. Vamos fazer mais projetos com a Cycloid em mais museus em Portugal e não há razão nenhuma para que não consigam exportar a forma como o fazem para museus noutros países.
Nós próprios na Vodafone, tal como recebemos as experiências dos nossos colegas noutros países, fazemos o mesmo e exportamos as nossas experiências.
Temos dado uma ajuda a um conjunto de empresas portuguesas para se internacionalizarem e achamos que o vamos continuar a fazer com o 5G e concretamente na realidade aumentada e virtual.
Acredita que estas soluções vão mesmo mudar a forma como aprendemos, trabalhamos, comunicamos e colaboramos?
O que posso garantir com elevado grau de certeza, até porque participei no teste da Cruz Vermelha, é que quando vemos isto a funcionar não só acreditamos na tecnologia como vemos o impacto que pode ter para salvar vidas humanas.
Quando vejo isto fico a pensar que é minha obrigação contribuir para que ande o mais depressa possível. Nesse sentido sim, tenho a certeza que há um conjunto de casos de utilização que são altamente importantes de disseminar e implementar na sociedade, concretamente em Portugal.
A Vodafone tem estado a reforçar o investimento nesta área?
A Vodafone, no seu plano de negócios, tem um investimento muito grande relacionado como 5G. Esse investimento passa pela capacitação da nossa cobertura e cumprirmos todas as metas da licença que ganhámos e passa também pelas competências para tirar partido do 5G. Faz parte deste plano de negócios ganhar estas competências na realidade aumentada e virtual.
Esta conferência e este investimento acontecem numa situação com fatores externos importantes. Que impactos observam da crise pandémica e agora da crise da inflação e guerra na Ucrânia?
Estamos aqui a falar de uma série de temas que têm efeitos contrários. Por um lado, o aumento dos custos da energia e combustíveis e a inflação faz aumentar os custos em áreas críticas para as empresas, e isso pode levar a que adiem alguns investimento. Empresas que no seu plano de digitalização até podiam ver aqui oportunidade e interesse em avançar, face a estes constrangimentos podem adiar isto um pouco. Isso é um efeito negativo.
Depois temos a questão dos componentes. Quando falamos em desenvolvimento de hardware, HoloLens mais leves e que tiram partido do 5G, muitos destes equipamentos precisam de componentes que devido à pandemia estão em escassez, e o tema da Ucrânia não ajuda. São duas grandes áreas que nos fariam ficar menos otimistas.
No entanto, à medida que vai havendo mais empresas a utilizar isto, vão dando conta de que há ganhos imediatos. Há poupança de custos de deslocação, questões do ambiente e sustentabilidade, há a questão da experiência que depois propicia o aumento da visitação no caso da cultura, há a melhoria na forma como os alunos aprendem e ficam mais bem capacitados. Há dois tipos de pressões em sentidos contrários.
Acreditamos que esta tecnologia vai dar um salto grande. Continuamos a achar que 2025 é uma boa data para as nossas vidas do dia a dia mudarem substancialmente com estas tecnologias. Se não fossem todas estas questões até poderia andar mais depressa.
Poderá haver aqui um impulso do PRR, que tem alguma alocação virada para a modernização digital?
Há países onde os PRR locais têm um impacto muito maior nas empresas. O nosso PRR é muito virado para o sector público.
Dito isto, o PRR vai ter a sua componente porque vai haver possibilidades de cooperação do sector público. Tenho a certeza que as empresas portuguesas não deixarão de aproveitar eventuais verbas que venham, se não for no PRR, no próximo quadro comunitário Portugal 2030, onde temos esperança que haja maiores componentes de investimento na digitalização das empresas portuguesas.
Ana Rita Guerra