“Vai ser inevitável”, considera Alex Rühl, uma pioneira das narrativas em realidade virtual que fundou o estúdio especializado CATS are not PEAS. As tecnologias imersivas irão fazer parte do nosso quotidiano dentro de alguns anos, vaticina a especialista, que será uma das oradoras da Vodafone Business Conference sobre Realidade Estendida no dia 19 de maio.
“A inflexão de massas é quando chegarem os óculos simples, o que será dentro de uns cinco anos”, antecipa, apontando para um par de óculos transparentes. “A Apple vai lançar algo neste ou no próximo ano, e assim que a Apple entra em jogo é quando sabemos que o consumidor vai começar a prestar atenção.”
Para Alex Rühl, que mudou radicalmente de carreira quando saiu da indústria da televisão e mergulhou de cabeça na realidade virtual há sete anos, a realidade virtual e aumentada vai entrar no uso do dia-a-dia quando os dispositivos forem tão simples quanto os óculos graduados que usamos para ver. “Imaginem que têm cinco anos para começar e fazer parte do grupo de early adopters”, sublinha.
É neste momento que a responsável acredita que faz sentido para as empresas começarem a explorar a tecnologia e projetos que testem a sua aplicação. “A tecnologia está melhor e há mais coisas que são possíveis, de modo que começamos a ver uma nova onda de experimentação com as narrativas”, diz.
Mas avisa que não basta atirar com dispositivos imersivos para cima de problemas e esperar que aqueles os resolvam. “É preciso começar com a definição do que queremos que os utilizadores sintam, que impacto emocional queremos ter no utilizador. Se querem que sintam claustrofobia e desconforto, é possível fazer isso com o desenho da narrativa, do cenário à luz.”
Isto aplica-se, por exemplo, no treino de funcionários em realidade virtual: o que querem que a pessoa retenha daquela formação? Alex Rühl refere um projeto de treino em diversidade e inclusão, intitulado “In My Shoes”, que consegue fazer com que a pessoa que está a usar o dispositivo sinta alguns dos preconceitos inconscientes e entenda microagressões. “É algo que provavelmente não conseguiria se mostrasse apenas um vídeo”, explica Rühl. “É um meio que lidera com emoção e muito disso pode ser construído com o desenho do cenário, a iluminação e o som.”
Os resultados deste projeto, que está a ser usado por milhares de funcionários, mostram que o impacto da formação usando realidade virtual é muito maior que por outros meios. “É um catalisador para mudança real e isso para mim é o Santo Graal da imersão”, considera Rühl. “Se removermos a tecnologia, o que fica é o que estas pessoas sentem e o facto de agora entenderem os outros, porque estiveram no seu lugar.”
Conceber narrativas para um meio tão diferente como a realidade virtual é difícil e implica a utilização de métodos diferentes dos tradicionais. Curiosamente, isso também requer que se evite focar tudo na tecnologia. É o que Alex Rühl pretende explicar.
“Na conferência quero falar do lado humano da XR”, afirma. “O instinto de muita gente vai diretamente à tecnologia, pensam em ficção científica e invenções loucas, e muitas vezes esquecemo-nos de quem está a usar o dispositivo e o que queremos que sintam”, frisa.
“A minha palestra vai no sentido de desenhar com o utilizador em mente. Vou falar de experiências que tive, algumas mais bem sucedidas que outras, e o que é que as empresas podem aprender com a minha jornada nesta indústria.”
Um dos conselhos da especialista para empresas que querem começar agora é partirem com mente aberta e prontas a escutar. “Nada esmaga mais a inovação que pessoas no topo da hierarquia a ditar o que fazer com uma tecnologia que não compreendem”, avisa. “É preciso entrar nisto com mente aberta. É um pouco como quando as empresas tiveram de fazer a mudança para a internet, muitas pensaram que se a ignorassem a coisa desaparecia, mas não tiveram escolha.”
Um passo será perguntar aos funcionários se têm experiência com isto, porque às vezes as respostas surpreendem. E depois, “pensar em quais são as áreas problemáticas e como a XR pode resolver esse problema.” A mensagem central é que “isto está a chegar, quer queiram quer não.” Mais vale prepararem-se.
E isso parece estar a acontecer com mais frequência, sobretudo depois da pandemia de covid-19. Apesar de continuar a haver hesitação, porque ainda estamos numa fase de experimentação e há investimento envolvido, Rühl diz que as coisas estão a mudar.
“Sinto que nos últimos dois anos as marcas e empresas começaram a levar a realidade virtual mais a sério”, algo que está relacionado com os resultados de projetos pilotos e com as estatísticas que vão saindo e mostram o impacto da realidade virtual, por exemplo no aumento do envolvimento em formação e da retenção de talento.
“São resultados de negócio do mundo real, coisas que não se consegue fingir: obtém-se melhores retornos quando se usa realidade virtual em certos casos”, diz. “Mais empresas estão a ver estes sucessos e a prestar atenção.”
Olhando para o futuro de massas – quando der para ver notificações de mensagens nos óculos ou mergulhar em mundos virtuais com um toque na haste – Rühl visualiza uma utilização híbrida
“Quero sentar-me no sofá com realidade virtual? Nem por isso. Nesse caso, não me importaria de que só os 180 graus frontais estejam cobertos”, indica. “Ou talvez possamos estar a ver televisão com realidade aumentada a sair do televisor, para adicionar algo ao que estamos a ver”, continua. “A realidade aumentada e mista encaixam bem a fornecer contexto e design adicionais ao mundo real.”
Quanto à realidade virtual, terá sempre um caso de utilização à parte. Muito será realidade mista. “Vai ser todo um espectro.”
Ana Rita Guerra