“A realidade virtual consegue aumentar a taxa de retenção dos conteúdos.” Esta é uma das vertentes que torna tão importante a formação com recurso a tecnologias imersivas. Segundo explicou ao Dinheiro Vivo Ricardo Amaral, médico intensivista que falou na Vodafone Business Conference, os benefícios da XR na formação médica são cada vez mais evidentes. “Conseguimos que, ao colocar os nossos formandos naquele mundo paralelo, eles vivam intensamente aquela experiência e consigam adquirir melhor o conteúdo e retê-lo”, afirmou o médico, à margem da conferência.
Em palco, Ricardo Amaral explicou os contornos do projeto PrepaCare XR que o Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro está a fazer em consórcio com a Universidade de Trás-os-Montes, a Universidade Técnica de Viena, a Universidade de Ciências Aplicadas da Lapónia e a Universidade de Bérgamo. Com a duração de um ano e financiamento europeu de 300 mil euros, o intuito é criar uma plataforma de treino em realidade virtual que começa na via área difícil, a intubação de doentes em estado crítico, e poderá ser alargada a outras áreas.
“O centro hospitalar entra neste projeto quase como um conselheiro clínico”, disse. “Fazemos a ponte para a aplicabilidade da realidade estendida, dos vários projetos de simulação que o PrepaCare XR tem, e portanto damos a visão mais prática, tentamos aplicar o conteúdo e moldar aquilo que é possível junto com os engenheiros que trabalham connosco.” O que os profissionais portugueses fizeram foi desenvolver uma primeira ferramenta de realidade virtual para distribuir conteúdo e depois a simulação utilizando manequins de alta fidelidade.
“Para o futuro, aquilo que vamos fazer é aplicar esta simulação à realidade virtual, de forma a conseguirmos chegar a mais pessoas e de forma mais fácil”, explicou.
O horizonte temporal aponta para que, em setembro deste ano, já haja um protótipo de realidade virtual e a sua aplicação seja feita até ao final do projeto, que acontecerá na primavera de 2023.
“Nesta fase estamos a desenhá-lo muito para as necessidades que o nosso centro hospitalar tem, mas com a possibilidade de escalar isto e ser difundido em termos europeus.”
Além da maior retenção de conteúdos que este formato permite, uma componente importante do projeto é permitir treinar sem colocar em risco nenhum doente. Ricardo Amaral explica: “O ensino clássico é muito clínico, muito baseado no doente, e claro que existem riscos para o doente ao termos essa abordagem.” Com a realidade virtual e outros métodos de simulação esse risco é eliminado ao mesmo tempo que se proporciona uma experiência formativa “tão ou mais enriquecedora.”
Este ponto foi salientado por Elsa Justino, vogal executiva do conselho de administração do centro hospitalar, que também deu uma palestra na Vodafone Business Conference. “Um objetivo importantíssimo é poder fazer um treino repetido e sem dor para o doente, porque estamos a falar em simulação, e também fazer um treino em eventos críticos e em eventos que não acontecem muitas vezes”, disse ao Dinheiro Vivo. “Ou seja, há situações em medicina que não acontecem todos os dias, mas quando acontecem é preciso estar nelas e saber o que fazer. E treinar esses eventos críticos de forma continuada e em equipa permite ter muito melhor performance e permite aos profissionais avançarem para o evento crítico com mais confiança.”
Elsa Justino sintetizou o intuito do PrepaCare XR: fazer a aprendizagem e o treino de profissionais e estudantes de saúde na área da emergência médica, desenvolvendo conteúdos que começam em simulação e e-learning e depois passarão a conteúdos virtuais. A responsável salientou a importância do consórcio europeu que está por detrás do projeto e das parcerias envolvidas. “Nós já vínhamos de uma parceria anterior e contamos no futuro densificar estes conteúdos e esta aprendizagem para vir a propor, no âmbito do eHealth e do financiamento europeu, um projeto ainda mais longo e com mais financiamento, para podermos desenvolver mais conteúdos em diversas áreas da medicina”, revelou. “Estamos a falar, por exemplo, em conteúdos da psiquiatria, da dor, e também eventualmente termos mais parceiros, porque outras universidades poderão estar interessadas”, continuou. “Quanto mais parceiros tivermos melhor, até porque a transferibilidade do conhecimento é imensa, não é limitável através da tecnologia.”
A administradora considerou que o treino virtualizado será a norma no futuro e que estas tecnologias vão também permitir aperfeiçoar o uso de meios complementares de diagnóstico.
“A medicina está sempre à procura da última inovação”, afirmou. “É das áreas que mais utiliza a inovação, porque ela faz a diferença na vida das pessoas, e muitas vezes entre vida e a morte. E isso é uma responsabilidade muito grande que todas as pessoas que estão no setor da saúde adotam.”
Ana Rita Guerra