Assistentes digitais, bots de conversação e sistemas que automatizam tarefas tornaram-se faces imediatas e visíveis da aplicação de modelos de Inteligência Artificial, principalmente no último ano. A apetência dos empresários portugueses pelo tema ficou patente na afluência à 5ª edição da Vodafone Business Conference, que decorreu em Lisboa e foi dedicada a este tema, sob o mote “Inteligência Artificial: Do lado certo dos negócios.” O administrador da Vodafone com o pelouro da unidade de negócios empresarial, Henrique Fonseca, falou ao Dinheiro Vivo no rescaldo do evento, salientando o momento da iniciativa.
“Nunca tínhamos tido tantas pessoas inscritas, nunca tivemos tantas pessoas a vir presencialmente à conferência”, indicou, “portanto eu diria que isto demonstra como este é um tema importante na sociedade, que as pessoas têm curiosidade em perceber mais, que os empresários querem perceber como é que podem utilizar para poder ser mais produtivos, mais eficientes”.
Alguns serviços a Vodafone está a testar dentro de casa, como é o caso da automação de tarefas simples e repetitivas e o uso de chatbots em interações do serviço de apoio ao cliente. São situações em que “não há necessidade de falar com uma pessoa e um chatbot tem claramente uma vantagem em termos de rapidez e eficiência”, referiu. Tanto para a empresa, que serve mais rapidamente, quer para os clientes, que querem os problemas resolvidos.
Outro ponto de aplicação é na gestão da rede. “Hoje em dia, através da Inteligência Artificial, conseguimos ser muito mais eficientes na utilização de energia graças à IA”, indicou Henrique Fonseca. “Podemos ligar e desligar a nossa rede em função da procura.”
O administrador referiu, por outro lado, que com o 5G e a sensorização são produzidas quantidades exponenciais de dados e a IA ajuda a geri-los e a transformá-los em operações mais eficientes.
É o que acontece num dos casos de utilização de maiores dimensões no país, um projeto com o Porto de Aveiro que combina várias tecnologias de IA, 5G e Internet das Coisas (IoT).
“Utilizámos a Inteligência Artificial para ajudar a arrumar a carga que é descarregada dos navios”, descreveu. “Cada vez que chega um navio, há uma empilhadora que vai buscar a carga e, em função da dimensão da carga, do dia em que chegou e do dia em que se vai embora, a Inteligência Artificial ajuda a arrumar a carga no armazém, por forma a maximizar o espaço e a diminuir o tempo que o empilhador leva a ir buscá-la e a arrumá-la no sítio certo.” Requer menos gasolina e aumenta a eficiência, considerou. “Isto não é ficção científica. Isto acontece hoje em Portugal.”
Uma das questões abordadas nas apresentações da conferência foi a transformação do mercado laboral e a incerteza que esta fase acarreta para os trabalhadores que receiam ser substituídos por tecnologia.
“Vemos essas questões de uma forma muito responsável e nós próprios temos políticas internas sobre o desenvolvimento de serviços com base em Inteligência Artificial”, indicou Henrique Fonseca.
O administrador referiu os ângulos abordados pelos oradores, que lembraram o que aconteceu noutras eras transformadoras.
“Aquilo que estamos a viver hoje vivemos com outras tecnologias no passado”, afirmou. “Já há muitos anos que se fala em industrialização, em modernização, no impacto que isso vai ter nos empregos”, continuou. !”Passados estes anos todos, o que vemos é que os seres humanos têm esta capacidade de se adaptar, de reinventar, de conseguir pôr as máquinas a trabalhar para eles e concentrarem-se naquilo onde podem acrescentar mais valor e ninguém os pode substituir.”
O professor Arlindo Oliveira mencionou esta questão cíclica e o analista Benedict Evans apontou que há sempre algum deslocamento de postos de trabalho com a modernização.
“Vimos desmistificar alguns desses receios”, disse Henrique Fonseca, ressalvando que há cuidados a ter. “É muito importante sermos responsáveis na forma como olhamos para esta matéria, mas também foi interessante perceber que isto não é uma coisa de hoje”, sublinhou. “Ao longo do nosso processo de industrialização e desenvolvimento tivemos outros momentos em que passámos por isto.”
Um outro ponto de reflexão foi o processo de regulamentação que está em curso na Europa. O AI Act da União Europeia, a ser aprovado, será o primeiro regulamento totalmente devotado à Inteligência Artificial. Mas tem sido alvo de críticas por parte de empresas e especialistas europeus, que temem um estrangulamento da inovação.
“A regulação é sempre um pau de dois bicos”, admite Henrique Fonseca. “Temos de ver exatamente o que é que temos para regular”, disse, considerando que isso se tornará mais claro ao longo do tempo. “Regulação boa sim, agora a regulação não nos pode impedir de explorarmos alternativas”, opinou.
Do outro lado da moeda, há o risco de atribuir peso excessivo à IA, mesmo quando pode não fazer sentido.
“Uma empresa não pode pensar que a Inteligência Artificial é a solução para todos os seus problemas ou desafios”, considerou o administrador. “A primeira coisa que a empresa tem que ter noção é qual é o desafio que tem.”
Em função disso, continuou, há um processo de identificação da melhor tecnologia para resolver o desafio, que pode ou não ser IA.
“Não queremos ir para ali com soluções pré-feitas, já desenhadas, uma receita para todas as empresas”, afirmou o administrador. “Cada empresa tem desafios diferentes e ajudamos a encontrar soluções para esses desafios”, referiu. Há um processo de cocriação com o objetivo de “ajudar as empresas a serem mais produtivas, mais eficientes, mas rentáveis e a contribuírem mais para a sociedade.”
Ana Rita Guerra