A visão podia ser pedir ao frigorífico que descreva o que se pode fazer para jantar, mas o que as fabricantes têm em mente vai ainda mais além: os eletrodomésticos vão ser pró-ativos e sugerir receitas, encomendar itens quando alguma coisa está prestes a acabar e funcionar como um apoio que facilita a vida dos consumidores. Foi isto que vimos em Las Vegas, durante a mais importante feira tecnológica do ano, CES. A tendência é transversal ao mercado, não apenas às marcas de eletrodomésticos dominantes, mas são estas – da Samsung à LG ou Whirlpool – que lideram a tendência. Este cenário de cozinhas e salas conectadas, em que os aparelhos comunicam entre si, atingiu um pico de sofisticação que vai começar a chegar às casas de cada vez mais consumidores, não apenas daqueles que têm queda para ir comprar os últimos gritos a preços exorbitantes.
Isso é visível na estratégia da LG, que anunciou a intenção de estender a inteligência artificial e conectividade a todos os seus eletrodomésticos. A marca sul-coreana tem uma estratégia dupla: por um lado, introduziu o pequeno robô doméstico CLOi, com o qual o utilizador interage por voz. “Cloi, como está a minha agenda?”, perguntou David VanderWaal, vice presidente de marketing da LG Electronics, durante a demonstração da tecnologia. “Tens ginásio às 10. O Smart Learner escolheu o ciclo de lavagem para roupa desportiva”, informou a assistente. O que isto quer dizer é que a máquina de lavar escolhe automaticamente o tipo de lavagem conforme a agenda do utilizador – neste caso, antecipando a necessidade de lavar roupa usada no ginásio.
A outra estratégia é a integração de Amazon Alexa e Google Assistant nos eletrodomésticos, com destaque para as televisões LG, de forma a usar comandos de voz; por exemplo, pedir à tv que ligue o purificador de ar. “Você pode conectar e controlar todos os aparelhos IoT”, explicou VanderWaal, referindo desde o aspirador robótico até às lâmpadas e ao ar condicionado. Todas as televisões inteligentes da LG estão agora equipadas com equipadas com tecnologia ThinQ, que é a marca-chapéu desta nova estratégia. Na base dos produtos está a plataforma proprietária de desenvolvimento de inteligência artificial Deep ThinQ, que tem capacidades de deep learning para que os aparelhos se adaptem à personalidade do consumidor. Gradualmente, a LG vai levar a inteligência a cada vez mais eletrodomésticos, como é o caso dos fornos inteligentes, que mais lá para o final do ano vão integrar os serviços Innit e SideChef. Um cenário em que os aparelhos cozinham sozinhos já esteve mais longe.
O outro aspeto importante é a compatibilidade dos produtos IoT que não são fabricados pela marca e o compromisso com standards abertos – algo que a Samsung também abraçou e que esteve no centro da sua apresentação na feira CES.
Pelo lado do conglomerado sul-coreano, a estratégia centra-se na SmartThings, que passa a unificar as iniciativas de Internet das Coisas lançadas anteriormente – a app irá conter a Samsung Connect, Smart Home e Smart View. A aplicação será lançada na primavera e permitirá ao consumidor usar um único centro de controlo para todos os aparelhos com ligação à internet que tem dentro de casa. Assim uma espécie de consola central para a IoT doméstica.
“Todos os aparelhos conectados Samsung terão inteligência embebida em 2020”, prometeu a empresa em Las Vegas. “Na Samsung, acreditamos que a IoT deve ser tão simples quanto premir um interruptor”, disse HS Kim, presidente da divisão de eletrónica de consumo da empresa. “Estamos empenhados em acelerar a adoção de IoT para toda a gente”, referiu, dizendo que “estes avanços vão ajudar os consumidores a terem os benefícios de uma vida conectada e transparente.”
Tal como a LG, a filosofia IoT da Samsung assenta em plataformas abertas, em que diferentes aparelhos se interligam e podem ser controlados por um sistema central. Ambas as empresas querem reduzir a fragmentação do ecossistema, que consideram ser uma barreira à adoção de mais dispositivos IoT. A Open Connectivity Foundation está a trabalhar para implementar padrões na indústria que facilitem a interoperabilidade.
A SmartThings vai funcionar nas televisões, smartphones ou sistema de bordo nos carros compatíveis (a Samsung anunciou uma nova parceria com a Harman precisamente para automóveis). Mas segundo o que mostrou na CES, o foco da empresa está nas televisões, tal como a LG: a ideia é que o utilizador interaja por voz e controle luzes, temperatura, som e ambiente através da TV.
A empregada doméstica dos Jetsons, Rosie, está mais próxima do que parece – mas não será um robô. Poderá ter vários nomes e um deles será Yummly, a assistente virtual que ajuda os consumidores a cozinhar com eletrodomésticos Whirlpool. A app aprende os gostos dos utilizadores e começa a sugerir receitas com base em necessidades nutricionais e nível de experiência atrás do fogão. As próximas funcionalidades serão reconhecimento de ingredientes e assistência durante a receita. Uma das tecnologias permite fazer um scan de códigos de barras e enviar automaticamente instruções de temperatura aos fornos e microondas através da app da Whirlpool. Já a nova máquina de lavar e secar tem reconhecimento de voz, faz a transição do ciclo de lavagem para secagem automaticamente e até tem um sistema de dispensa de detergente.
Ao todo, a marca introduziu 25 novos aparelhos com inteligência embebida em Las Vegas. Integrou as assistentes inteligentes Alexa (Amazon) e Assistant (Google) nos seus eletrodomésticos, além de acesso via Apple Watch, e também anunciou parcerias com a Honeywell, Nest e Instacart.
Todas estas novidades estarão disponíveis já na primeira metade do ano. E embora alguns dos aparelhos conectados mostrados na CES levantem sobrolhos – como a almofada que se abraça ou o cão robótico da Sony – pode dizer-se que 2018 é o ano em que as fabricantes acreditam que a IoT doméstica vai fazer a diferença.